Hildebrando: a vida imita a arte
O mais recente episódio da política brasileira mostrou-nos mais um bandido, Hildebrando Pascoal. Mais um para a galeria
composta de Sérgio Naya, PC ( que Deus o tenha), João Alves ( o da loteria), Georgina ( a do INSS) e outros simpáticos e competentes
heróis. Todos temos sentimentos ambíguos em relação aos canalhas. Medo, admiração, fascínio, raiva, vontade de vingança, e
até pena, às vezes.
Quem se lembra dos antigos filmes de cowboy sabe como é importante um bandido ruim. Quanto pior o bandido, melhor
a vingança do mocinho. Quanto mais cruel a atitude inicial do calhorda, mais delicioso o Happy end, a morte ou o exílio definitivo
do danado. Bandido bom mesmo tinha que ser perverso, hediondo, sórdido, cínico, atrevido, mentiroso, traiçoeiro e , sobretudo,
poderoso. Talvez este último adjetivo é que seja o responsável pela fascinação
que estes velhacos provocam no povo. O cinema nos trouxe grandes atores especializados
em fazer grandes bandidos: Jack Palance, com sua cara de mau e Vincent Price com sua admirável canastrice, são apenas dois
exemplos. Que graça tem um bandido fraco, ingênuo, solidário, caridoso? É a eterna
luta do bem contra o mal. Não se pode imaginar um filme destes sem o vilão. O mocinho ficaria durante toda a história andando
a cavalo e apenas namorando a mocinha. Que coisa sem graça! Não haveria ninguém para vingar e descarregar a raiva que todo
mocinho deve ter de todo bandido por todas as maldades que ele fez e possa vir a fazer. É o que dá emoção à história.
Também nas novelas, sentimos a necessidade da presença de um bom vilão, ou uma boa vilã. O interesse na trama aumenta
à medida que aumentam as crueldades dos bandidos e das madrastas más. Tal é a importância destes papéis que geralmente são
entregues a grandes artistas. Muitas vezes, dão muito mais IBOPE do que os heróis.
A mídia, toda poderosa, sabe o quanto o povo ama os bandidos. Então,
nos mostra tudo: como dormem, o que comem, como amam, como se vestem, onde moram, como gastam o dinheiro que roubam. Tudo
isto dá uma grande audiência.
Hildebrando é perfeito. Tem tudo para ser um excelente canalha. Desbancou
seus antecessores. Sérgio Naia vira um escoteiro assustado e Georgina, filha de Maria. Mesmo que não tenha culpa, ele apresenta
todos os cacoetes de um bom vilão. Tem cara, voz, cinismo, olhar, postura, tudo
de um grande canalha. E, como convém a um canalha, tem atitudes bipolares: manda matar um desafeto com moto-serra, e distribui,
no natal , cobertores e brinquedos para os pobres. É um santo. É um demônio. Tem, às vezes, gestos cheios de ternura, intercalados
com atos de requintada crueldade. Presumo que fique comovido ao saber que há pessoas que não têm o que comer, mas jamais se
sentirá culpado por isto. Como todo grande patife, gosta de ostentar o poder. É um solitário, embora viva cercado de correligionários
e capangas, que a esta altura devem ter desaparecido. É tão hipócrita, que acha que não há nada demais em ser mafioso e deputado
ao mesmo tempo. Acha que pequenos delitos, como mandar soltar traficantes, não trazem problema nenhum.
Como
podem dizer isto de uma pessoa como eu? O povo me escolheu, de livre e espontânea
vontade. Como podem fazer uma tamanha injustiça?
E os quarenta e um deputados que votaram contra a cassação? Que motivo os teria levado a tal escolha? Seriam eles
cidadãos de um altíssimo senso de benevolência que teriam, num gesto de extrema bondade, perdoado estas pequenas travessuras
do colega? Ou....deixa pra lá!
E assim continua a vida imitando a arte. Vem aí o próximo capítulo: o suplente do Hildebrando vai tomar posse. Este
eu não perco! Dizem que é ótimo.